3.1 Dados do problema
3.2 Curvas compostas e determinação do consumo mínimo de utilidades
3.3 Número mínimo de unidades
3.4 Estimativa da área de transferência de calor
3.5 Avaliação de custos
3.6 Projecto da Rede
Referências
Nesta secção é considerado um exemplo de ilustração, relativo à aplicação da metodologia sequencial de projecto óptimo de redes de transferência de calor. O simulador disponível em <http://labvirtual.eq.uc.pt/cgi-bin/intenerg> pode ser usado para confirmar os valores obtidos, e obter resultados adicionais.
3.1 Dados do problema
O exemplo considerado possui 2 correntes quentes e 2 correntes frias. Considera-se ocorre uma mudança de fase numa corrente quente (H2), no decurso do processo. Os dados relativos às correntes, utilidades disponíveis, e coeficientes de transferência de calor usados são apresentados nas Tabelas 1–3.
Tabela 1: Dados das correntes do processo.
Corrente
| T ent (K)
| T sai (K)
| CP (kW?K)
| Estado |
H1 | 450 | 325 | 5 | líquido |
H2v | 400 | 375 | 10 | vapor |
H2c | 375 | 374 | 1000 | condensante |
H2l | 374 | 330 | 18 | líquido |
C1 | 310 | 350 | 8 | líquido |
C2 | 370 | 460 | 15 | vapor |
Tabela 2: Dados das utilidades disponíveis.
Utilidade | T ent (K)
| T sai (K)
| Custo (€ ?GJ)
|
Vapor AP | 500 | 500 | 8 |
Vapor BP | 350 | 350 | 3 |
Água de arref. | 305 | 325 | 0,12 |
Tabela 3: Coeficientes de transferência de calor.
Correntes | h (W(m2K)-1)
|
Vapor | 200 |
Líquido | 1000 |
Condensante | 9000 |
Para facilitar os cálculos considerou-se um intervalo de temperatura (fictício) relativo à mudança de fase de 1 K. Admite-se neste exemplo a possibilidade de geração de vapor de baixa pressão (BP), como modo de arrefecimento do processo, caso as temperaturas o permitam. Nesse caso, o vapor formado será valorizado ao preço indicado na Tabela 2. Também para simplificar o problema, os coeficientes de transferência de calor apresentados na Tabela 3 dependem apenas do estado físico das correntes. Para estimar o custo dos permutadores foi usada a expressão
com os coeficientes apresentados na Tabela 4. Os restantes dados necessários para a determinação dos custos anuais são apresentados na Tabela 5. Nesta análise foi considerada uma ΔTmin = 10 K.
Tabela 4: Coeficientes para estimativa de custos dos permutadores.
Coeficiente
| Valor
|
a | 40000 |
b | 2800 |
c | 0,8 |
3.2 Curvas compostas e determinação do consumo mínimo de utilidades
Para identificar os intervalos de temperatura do problema é conveniente usar temperaturas fictícias para as correntes. Estas definem-se através das fórmulas:
Deste modo, pode ser criada a correspondente tabela do problema (Tabela 6). O resíduo de calor introduzido no intervalo 0 corresponde à quantidade mínima de calor necessária
Tabela 5: Parâmetros económicos para a determinação de custos.
Parâmetro | Valor
|
Taxa de actualização (r) | 5% |
No. de anos (n) | 10 |
No. de horas/ano (hano) | 8000 |
para que todos os resíduos de calor nos intervalos subsequentes sejam não-negativos, de acordo com o diagrama de cascata de calor apresentado na Figura 5. Este diagrama permite concluir que, para uma ΔTmin = 10 K, os consumos mínimos de utilidades são neste exemplo 800 kW de utilidade quente e 1797 kW de utilidade fria. É possível ainda observar a existência de 2 pontos de estrangulamento neste problema, correspondentes a 2 níveis de temperatura consecutivos: 375 K e 395 K (temperaturas fictícias). Deste modo, serão encontradas 3 subredes neste problema.
O diagrama das curvas compostas individuais corresponde à Figura 6. Representando graficamente os resíduos de calor da Tabela 6, é possível obter o diagrama da curva composta global do problema (Figura 7). Confirma-se neste último diagrama que é vantajoso produzir neste problema vapor de baixa pressão, usando-o como utilidade fria. Desta forma, é possível reduzir o consumo de água de arrefecimento de 1797 para 395 kW.
Tabela 6: Tabela do problema (balanços energéticos em cada intervalo de temperaturas).
| T inf
| T sup
| ΔT
| ∑iCPi(F -Q) | ΔH
| Resíduo
|
No.
| (K)
| (K)
| (K) | (kW?K)
| (kW)
| (kW)
| Correntes |
0 | 465 | ∞ | ∞ | 0 | 0 | 800 | — |
1 | 445 | 465 | 20 | 15 | 300 | 500 | C2 |
2 | 395 | 445 | 50 | 10 | 500 | 0 | H1, C2 |
3 | 375 | 395 | 20 | 0 | 0 | 0 | H1, H2v, C2 |
4 | 370 | 375 | 5 | -15 | -75 | 75 | H1, H2v |
5 | 369 | 370 | 1 | -1005 | -1005 | 1080 | H1, H2c |
6 | 355 | 369 | 14 | -23 | -322 | 1402 | H1, H2l |
7 | 325 | 355 | 30 | -15 | -450 | 1852 | H1, H2l, C1 |
8 | 320 | 325 | 5 | 3 | 15 | 1837 | H1, C1 |
9 | 315 | 320 | 5 | 8 | 40 | 1797 | C1 |
Figura 05: Diagrama de cascata de calor.
Figura 06: Diagrama das curvas compostas individuais.
Figura 07: Diagrama da curvas composta global.
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3.3 Número mínimo de unidades
Aplicando a equação (1) em cada uma das zonas térmicas do problema obtêm-se as estimativas para o número mínimo de unidades do problema apresentadas na Tabela 7. Para efeitos de contagem, a corrente H2 (que muda de fase) foi apenas considerada uma vez, nesta tabela. Isto pressupõe a possibilidade de encontrar, mais tarde, um conjunto de emparelhamentos onde não será necessário considerar separadamente cada um dos estados físicos desta corrente (H2v, H2c, H2l). Caso isso não se verifique, será necessário um número superior de unidades na zona abaixo dos 2 PE.
Tabela 7: Estimativa do número mínimo de unidades.
| |
|
Zona | Correntes | No. mínimo de unidades |
Acima dos PE | H1, C2, Vapor AP | 2 |
Entre os 2 PE | H1, H2, C2 | 2 |
Abaixo dos PE | H1, H2, C1, Vapor BP, Água arref. | 4 |
Somando os valores obtidos, estima-se a necessidade de um total de 8 permutadores de calor nesta rede.
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3.4 Estimativa da área de transferência de calor
Para estimar a área de transferência de calor, é conveniente modificar o diagrama das curvas compostas individuais (Figura 6), introduzindo as curvas correspondentes aos consumos de utilidades previamente identificados. Obtém-se assim o diagrama das curvas compostas individuais balanceado (Figura 8). Aplicando a equação (2) obtêm-se os valores apresentados na Tabela 8. A Tabela 9 sumariza a estimativa do número e tamanho médio das unidades em cada zona térmica do problema.
Tabela 8: Estimativa da área de transferência de calor necessária.
Intervalo | Área (m2) | Intervalo | Área (m2) |
A1 | 2,3 | A6 | 10,3 |
A2 | 33,1 | A7 | 260,0 |
A3 | 31,5 | A8 | 66,0 |
A4 | 22,4 | A9 | 65,0 |
A5 | 9,3 |
Total | | | 500,0 |
No diagrama das curvas compostas balanceado, é também visível que a introdução da geração de vapor de BP causou o aparecimento de um novo PE (entre A3 e A4). Estes PE adicionais são também conhecidos como pontos de estrangulamento introduzidos por utilidades, e ocorrem sempre que nos diagramas da curva composta global (Figura 7) se maximiza o uso de uma utilidade num nível de temperaturas intermédio, encostando a respectiva curva da utilidade à curva composta do processo. O ponto de contacto das 2 curvas passa a constituir um novo PE do processo (ΔT=ΔTmin). Este facto pode também ser constatado recalculando o diagrama de cascata de calor para o processo, incluindo o vapor de BP conjuntamente com as restantes correntes do processo (Figura 9).
Figura 08: Diagrama das curvas compostas individuais balanceado (para estimativa da área).
Tabela 9: Estimativa da área média (individual) de transferência de calor em cada zona.
Zona | Atotal (m2)
| nu,min
| Aind (m2)
|
Acima dos PE | 130,9 | 2 | 65,5 |
Entre os PE | 260,0 | 2 | 130,0 |
Abaixo dos PE | 108,8 | 4 | 27,2 |
Figura 09: Diagrama de cascata de calor, considerando a produção de vapor de BP.
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3.5 Avaliação de custos
Os dados anteriores permitem a estimativa dos custos totais anuais da rede com consumo mínimo, para o conjunto de utilidades fornecido, considerando ΔTmin = 10 K. Os valores são apresentados nas Tabelas 10–12. Como se pode observar, os gastos com utilidades representam, neste caso, cerca de 1/3 dos custos totais anuais. Pode verificar-se também que, com os dados usados, o valor do vapor de BP formado permite reduzir consideravelmente o consumo anual de utilidades.
Uma vez que o valor de ΔTmin = 10 K foi escolhido inicialmente de forma arbitrária, este poderá não corresponder ao valor óptimo. Assim, o procedimento anterior deverá ser repetido, variando este parâmetro e registando a sensibilidade do custo total estimado, para identificar a solução óptima do problema.
Tabela 10: Custos anuais de utilidades na rede.
Utilidade | Consumo (kW)
| Custo anual (k€ ?ano)
|
Vapor AP | 800 | 184,3 |
Vapor BP | -1402 | -121,1 |
Água arref. | 395 | 1,4 |
Total | — | 64,6 |
Tabela 11: Custos anualizados de investimento.
| Custo total
| Custo anualizado
|
Zona | (k€ )
| (k€ ?ano)
|
Acima dos PE | 238,9 | 30,9 |
Entre os PE | 355,0 | 46,0 |
Abaixo dos PE | 317,4 | 41,1 |
Total | 911,3 | 118,0 |
Tabela 12: Custos totais (anuais) da rede de permutadores de calor.
Parcela | Valor (kC ?ano)
| Percentagem
|
Utilidades | 64,6 | 35 |
Custos anualizados | 118,0 | 65 |
Total | 182,6 | 100 |
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3.6 Projecto da rede
Após a localização dos PE e a determinação do consumo mínimo de utilidades, torna-se possível o projecto da rede de permutadores adequada para o problema, aplicando as regras enunciadas na Secção 2.1.4. Uma vez que neste problema foram identificadas 3 zonas térmicas, o projecto de cada subrede será efectuado separadamente.
Zona acima dos 2 PE: Acima da temperatura fictícia de 395 K apenas existem as correntes processuais H1 e C2. Uma vez que nesta zona apenas é possível usar utilidade quente (vapor AP) o diagrama da rede é deduzido facilmente (Figura 10).
Figura 10: Rede de permutadores acima dos 2 PE.
Zona entre os 2 PE: Nesta zona existem 3 correntes (H1, H2v e C2). As regras da Secção 2.1.4 indicam que se deve iniciar o projecto dos PE para dentro, impondo restrições inversas quanto ao sinal de CPQ−CPF em cada extremo do intervalo. Deste modo, a única alternativa nesta zona é particionar C2, por forma a satisfazer as necessidades de H1 e H2v, separadamente (CPQ = CPF). A rede correspondente é representada na Figura 11.
Figura 11: Rede de permutadores entre os 2 PE.
Zona abaixo dos 2 PE: Nesta zona estão presentes 3 correntes (H1, H2 — com mudança de fase, e C1). Através do diagrama da curva composta global, verificou-se ainda ser vantajoso produzir vapor de BP (1402 kW), reduzindo significativamente o consumo de água de arrefecimento (395 kW). Tal como mencionado anteriormente, o PE de utilidades introduzido vai subdividir mais uma vez esta parte do diagrama. Na subrede entre o PE do processo e o PE da utilidade apenas é possível usar o vapor de BP. Aqui, as correntes H1 e H2 são arrefecidas de 380 K para 360 K (garantindo uma driving-force mínima de 10 K, bem como a transferência de exactamente 1402 kW). Para tal, são necessários dois permutadores de calor para gerar vapor de BP (Figura 12). Esta configuração permite ainda contemplar a mudança de fase de H2 (a 375 K) e o seu subarrefecimento posterior, numa única unidade.
Após este passo, para obter uma configuração de rede viável, é necessário aplicar novamente a regra dos CP abaixo do PE de utilidades (Secção 2.1.4). À saída do permutador de produção de vapor de BP, a corrente H2 está no estado líquido (CP = 18 kW/K); H1 tem um CP de 5 kW/K e C1 de 8 kW/K. Dado que nesta zona não é possível usar utilidade quente, a corrente C1 apenas pode ser emparelhada com H2, na vizinhança do PE de utilidades. Desta forma é possível completar facilmente a parte restante do diagrama da subrede (Figura 12).
Figura 12: Rede de permutadores abaixo dos 2 PE.
Finalmente, o diagrama completo da rede de permutadores de calor é apresentado na Figura 13. É possível verificar neste diagrama um percurso circular (assinalado), envolvendo os permutadores 1 e 2. Nestas situações, é ainda possível usar o procedimento de Kemp (2007) para simplificar adicionalmente a rede obtida, reduzindo o número de unidades necessário, através da quebra de percursos cíclicos.
A aplicação deste procedimento tem como potencial vantagem a redução dos custos de investimento necessários, que neste caso representam cerca de 2/3 dos custos totais anuais. No entanto, esta simplificação apenas é possível à custa de maiores consumos de utilidades, uma vez que neste caso se passa a transferir calor através de 1 (ou mais) PE. Devido a este facto, torna-se difícil avaliar o potencial efeito benéfico deste procedimento adicional, durante a aplicação da metodologia sequencial enunciada, sem efectuar o projecto detalhado (incluindo a simplificação) das diversas redes de transferência de calor, para cada ΔTmin considerado. Este facto pode ser considerado uma das principais limitações da metodologia sequencial, tal como foi descrita, sendo preferível, nestas situações, o uso de metodologias simultâneas, descritas em Biegler et al. (1997); Floudas (1995).
Figura 13: Rede de permutadores completa.
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Referências
- L.T. Biegler, I.E. Grossmann, A.W.Westerberg, SystematicMethods of Chemical Process Design, Prentice Hall, Englewood Cliffs, NJ, (1997).
- C.A. Floudas, Nonlinear and Mixed-Integer Optimization, Fundamentals and Applications, Oxford University Press, Oxford, (1995).
- T. Gundersen, A Process Integration PRIMER, SINTEF Energy Research, International Energy Agency, (2000).
- I.C. Kemp, Pinch Analysis and Process Integration, A User Guide on Process Integration for the Efficient Use of Energy, 2.a edição, Butterworth-Heinemann, Amsterdam, (2007).
- S. Relvas, M.C. Fernandes, H.A. Matos, C. Pedro Nunes, Integração de Processos — Uma Metodologia de Optimização Energética e Ambiental, Programa Operacional da Economia, (disponível em <http://gnip.ist.utl.pt/>), (2002).
- W.D. Seider, J.D. Seader, D.R. Lewin, Process Design Principles. Synthesis, Analysis and Evaluation, 2.a edição, J. Wiley & Sons, New York, N.Y., (2004).
- R. Smith, Chemical Process Design and Integration, J.Wiley& Sons, Chichester, (2005).